sábado, 26 de fevereiro de 2011

"Os Paraísos Artificiais"

"Acontece algumas vezes que a personalidade desaparece e que a objectividade, que é própria dos poetas pateístas, se desenvolve em vós tão anormalmente, que a contemplação dos objectos exteriores vos faz esquecer a vossa própria existência, não tardando a confundir-vos com eles. Os vossos olhos fixam-se numa árvore harmoniosa dobrada pelo vento: em alguns segundos, o que no cérebro de um poeta não seria mais do que uma comparação muito natural, tornar-se-á no vosso uma realidade. Começais por atribuir à árvore as vossas paixões, o vosso desejo ou a vossa melancolia; os seus gemidos e as suas oscilações tornam-se vossos, e não tarda que sejais árvore. Do mesmo modo, a ave que plana no fundo do céu azul começa por representar o imortal desejo de planar sobre as coisas humanas; mas logo sois a própria ave. Suponho-vos sentado a fumar. A vossa atenção descansará em demasia nas nuvens azuladas que se exalam do cachimbo. A ideia de uma evaporação lenta, sucessiva, eterna, apoderar-se-á do vosso espírito, e não tarda que apliqueis esta ideia aos vossos próprios pensamentos, à vossa matéria pensante."

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