quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

"Bion: O Zero da Experiência"

“Bion (1973) propõe então que seja dado um nome ao que não é possível conhecer, empregando um termo derivado da matemática - o Zero. Na verdade, o signo que emprega é "O", podendo ser lido como letra ou algarismo: em inglês, o som é o mesmo.
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Entretanto, como intermediário entre os números positivos e negativos, ou como o marco da interseção entre abcissa e ordenada nos eixos cartesianos, sugere a origem, a matriz de onde os números podem surgir.
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(...) essa multiplicidade que se recusa a uma simplificação fornece uma ténue imagem do que seja a experiência do 0: o inefável que escapa a toda e qualquer definição, apreensão, limite. Não se pode conhecer o Zero, só se pode vivê-lo.
(...) o Zero constitui a Verdade de cada momento. Os processos habituais de conhecimento não conseguem chegar até lá. (...) o Zero é um TODO cuja expressão global escapa a nossa percepção analítica. Dele emanam, contudo, aspectos que evoluem até se tornarem captáveis.
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(...) qualquer ciclo de transformação tem como ponto de partida o 0.
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O contato direto com 0 também supõe um "estado negativo de mente" em que a atividade positiva de investigação se substitui por uma atividade receptiva de estar de acordo e comunhão, quando se deixa de querer "saber sobre" e se fica "sendo" 0.
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Se o contato com 0 supõe supressão de memória, desejo e compreensão, estes são novamente necessários quando se trata de transformar depois este contato em um conhecimento. É assim que se torna possível ter vivências com aguda sensibilidade e no entanto não poder aprender da experiência. Isto se explica por essa maior captação, que exige um continente adequado, elástico e flexível (...).
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O movimento de "Transformação em 0" apresenta características de revelação integradora, articulada a partir da própria mente, emergindo um sentido que não é imposto "de fora" mas que abarca sensações antigas e presentes, assim como lhe revela seu próprio funcionamento mental. Não se trata de uma compreensão teórica, alcançada através de uma distância proporcionadora de perspectiva. Trata-se, ao invés, de uma experiência da natureza do êxtase – o que inclui um clima intensamente emocional - que já não se pode esquecer ou ignorar, pois passa a participar da constituição de sua mente, numa identidade com o revelado: "sendo" 0.”

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