domingo, 19 de fevereiro de 2012

"A Sonata De Kreutzer"

"Trata-se do que me aconteceu, a mim, e também a noventa e nove por cento dos homens (...); trata-se de uma coisa terrível: não perdi a inocência por ter cedido à sedução natural de uma certa mulher. Não, não me seduziu mulher nenhuma, apenas caí porque o meio que me rodeava via naquela queda ou um acto legal e benéfico para a saúde, na opinião de alguns, ou o mais natural divertimento de um jovem, não só perdoável mas até inocente. Eu nem sequer me apercebia de que havia ali uma queda, e comecei simplesmente a entregar-me àquela coisa que é em parte prazer, em parte necessidade, como me foi sugerido, numa determinada idade; comecei a entregar-me então a essa depravação, tal como comecei a beber e a fumar. Mesmo assim, naquela primeira queda havia algo de especial e comovedor. Lembro-me de que, logo a seguir, naquele mesmo quarto, senti uma grande tristeza, tão grande que me apetecia chorar, chorar a minha inocência perdida, a minha atitude para com a mulher irreparavelmente estragada. (...) Tornei-me no que se chama um devasso. Ora, ser devasso é um estado físico, semelhante ao do morfinómano, do alcoólico, do fumador. Tal como o morfinómano, o alcoólico e o fumador não são pessoas normais, um homem que conheceu sexualmente várias mulheres para seu prazer deixa de ser normal para se tornar um homem estragado para sempre, o devasso. (...) O devasso pode abster-se, pode lutar; mas jamais terá uma atitude simples, clara, pura... fraterna para com as mulheres. (...) fiquei assim para sempre, e foi isso que me levou à perdição."

Sem comentários:

Enviar um comentário

Apontamento