quarta-feira, 28 de maio de 2014

"O Pavilhão dos Cancerosos"

"Tinha uma farta cabeleira branca, o tipo de cabeleira que confere a um homem, seja génio ou idiota, santo ou patife, activo ou indolente, uma aura de calma nobreza. Tinha a aparência suave e impressionante que é a recompensa da natureza àqueles que nunca sofreram da dor atroz do pensar (...)."

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Enquanto Trabalhava

Dei comigo a pensar naquilo que estava a fazer (física e mecanicamente) naquele preciso instante, ia tombando com essa ideia do que fazia realmente. Recordei todos as inquietações, propósitos e sonhos de outrora, tudo quanto me tinha movido, aquilo que me tinha possibilitado uma continuação vivida entre o fim da adolescência e a idade adulta. Na verdade nunca me esqueci realmente, apenas procuro afundar dia a dia essas certezas todas de outrora, pois a realidade de hoje é, de facto, o maior teste à minha capacidade de aguentar o tédio, de sempre…

Por vezes, quando abro um livro intelectualmente muito estimulante, sinto uma certa revolta, por que esse simples abrir do livro deixou de ser parte integrante do meu viver diário, já não pode ser o principal. Agora o principal é produzir um determinado número num qualquer trabalho idiota de uma qualquer entidade desprovida de tesão. E este dia-a-dia é cancro, faz cancro, sinto-me a apodrecer por dentro da minha mente. A sociedade está a acabar com o meu intelecto, a minha libido, o meu amor pelas humanidades, artes e ciências. Pois agora apenas me cabe contar, seleccionar, informar, empilhar papéis, construir dossiers e nunca, mas nunca pensar, evitar ao máximo pensar, apenas executar e produzir números desconexos que nada explicitam da realidade. E mais uma vez, surge a mesma pergunta de sempre: o que é a realidade? O raio da realidade!

Na infância não podemos ser nós próprios devido às imposições e interditos expressos pelos nossos pais e avós. Durante a adolescência não podemos ser nós próprios devido aos limites impostos pela comunidade e sociedade como um todo. Por fim, chegamos esperançosos à idade adulta... Mas também não vamos poder ser nós próprios...